11/25/2003

INDÚSTRIA APÍCOLA : PERSPECTIVAS

Até 2002 o Brasil nunca havia exportado mel em volumes significativos. Com o advento da proibição de importação de mel chinês na Europa e nos EUA em 2002, compradores globais de mel (principalmente alemães e norte-americanos) recorreram à fontes alternativas para o suprimento de suas necessidades, sendo o Brasil um dos países que mais se destacaram juntamente com a Bulgária, Turquia e Vietnã. A forma pela qual a indústria apícola brasileira estava organizada contribuiu para a imediata aceitação do nosso mel e sua classificação como um dos melhores do mundo, produto isento de resíduos de antibióticos e livre de adulterações haja vista o adequado controle de entrada de matéria-prima por parte dos entrepostos.

Num primeiro momento , no começo de 2002, havia capacidade ociosa no setor de beneficiamento do mel (entrepostos) que, motivado pela explosão na demanda, elevou consistentemente os preços pagos aos apicultores. Mesmo assim os entrepostos lograram obter lucros extraordinários pois a velocidade de alta na cotação internacional do mel era maior que o aumento dos custos. Nesse período o acesso dos apicultores às informações sobre o mercado internacional era limitada o que permitiu aos entrepostos amealhar boa parte dos rendimentos auferidos com as exportações.

Num segundo momento, por volta de Setembro de 2002, os entrepostos j? estavam operando próximos de sua capacidade e muitos iniciaram projetos de ampliação de capacidade e atualização tecnológica. Os apicultores passaram a ter maior acesso aos dados do mercado internacional , começando a exigir preços cada vez maiores dos entrepostos que, para cobrir o novel maior de custo fixo, passaram a operar com margens decrescentes. Nessa época, não raro entrepostos colheram prejuízos pois a velocidade de aumento nos custos no era totalmente compensada pelas flutuações do câmbio e do preço do mel no mercado internacional.

A partir de Março de 2003 a situação acomodou-se, os preços iniciaram um movimento de queda e os compradores norte-americanos retraíram-se, em parte pelo crescente oferta de méis da Europa central, em parte pela boa safra nos estados produtores e em parte pela volta paulatina de méis da China isentos de clorafenicol. Ao mesmo tempo, os compradores alemães reduziram seu ritmo de compras em virtude da queda no consumo ocasionada pelo verão escaldante e pela elevação dos preços cobrados pelo varejo.

? medida em que aumenta a incerteza quanto ao preço futuro do mel, aumentam as incertezas sobre a viabilidade econômica de projetos de investimento. Assim, a indústria vive hoje um dilema : vale a pena investir na produção ? Vale a pena investir no beneficiamento de mel ?

O conflito distributivo entre os elos da cadeia produtiva é tal que em cenários de preços flutuantes o mercado torna-se volátil e instável, prejudicando as tomadas de decisão no médio e longo prazos e portanto afetando a taxa de investimento global da indústria. Portanto pode-se dizer que a taxa de investimento da indústria é menos elástica em relação ao preço do mel no mercado internacional do que poderia ser caso houvesse arranjos negociais diferenciados entre os entrepostos e os apicultores.

Nesse sentido, vale ressaltar que a taxa de investimento da indústria constitui-se de duas variáveis : a taxa de investimento em unidades processadoras (entrepostos) e a taxa de investimento nas unidades produtivas (apiários). O que temos notado é que os entrepostos têm investido numa proporção bem maior que os apiários o que vale dizer que o setor corre o risco de se auto impor uma situação de insustentabilidade no longo prazo. Ou seja, a capacidade de beneficiamento do mel tem crescido mais rapidamente que a produção. Isso torna-se mais preocupante à medida em que o fluxo de oferta dos principais países produtores (nomeadamente China e Argentina) tende a se normalizar no longo prazo. A inversão de recursos na produção a fim de equilibrar a equação do setor é pois única alternativa para proteger a indústria de flutuações bruscas na cotação do mel no mercado internacional. Caso contrário podemos vivenciar o pior dos mundos no qual os preços internacionais estariam caindo e as margens tanto dos apiários como dos entrepostos tenderiam ao "break even". Estaríamos assim trabalhando "de graça" para os compradores estrangeiros, no sentido em que estaríamos exportando mel processado em troca de um valor próximo ao custo de produção da cadeia. O aumento na produção de mel daria pois escala à indústria, compensando os investimentos ora realizados pelos entrepostos, sendo este (aumento nos volumes exportados) o único meio de suportar a provável queda das margens de lucro.